quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Cheiras bem

Trazes no corpo o espírito de um amor maduro


nos lábios o sabor de frutos silvestres.


É excitante o aroma que de ti me vem.


Trazes o esplendor de manhãs geadas


e o fogo de tardes de Agosto.


Cheiras bem.




Emerges em trovoadas de melodia


és sonho vermelho esmagado


palavra mordida ao acaso


espirito apurado nas encostas da vinha.


És a carícia de meia ladeira


que sobe alto, perturba e incendeia.




És o néctar puro da terra


o sol infiltrado no poema


bago cheio, duro e comprido


és o festival dos sentidos


vinho erotizado na parreira


a derramar-se em lábios intumescidos




Trazes as nuances subtis de cada folha


pintada em cada dia - com mestria


O pincel é férreo e a tinta de suor


num outono barroco, corado.


És um namoro de vertigem


beijo divino, apurado na cor.



Teresa Almeida

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Ósculo divino




Num olhar - num fascínio

adormecemos dores e medos

e paletas crivadas de esperança

pintamos

Entre o céu e a terra confundimos os tons

e em misteriosa harmonia

esvoaçamos

Na intensa luz que rompe o ventre da terra

e em amanhãs de fertilidade

acreditamos

É tão real esta miragem

que na singularidade de ósculos divinos

ao de leve - despertamos




Teresa Almeida

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

FICARAM-TE AS PALAVRAS



Como índio de arco e flecha
Acerta-las no alvo - bem no âmago
Não matas mas móis
E de tanto flechares
Começará a doer
E de tanto flechares
Romper-se-á a carapaça
Uma flor  de espanto nascerá no peito do prado
E libertará a terra agreste e angustiada

Guardas a coragem e a luta
Como um sonho amordaçado
Nem sabes que te escrevo
Nem sabes que te sinto
Mas creio que tens muitas cartas na caixa do correio
Talvez nunca saibas
Mas há muitas flores cerradas no bolbo
Regadas com o teu desvelo, firmeza e persistência
À espera duma aurora especial

Ainda veremos o campo coberto de flores
Rubras de autenticidade

Teresa Almeida

sábado, 6 de outubro de 2012

Sonho de gaivota

Nem sabes de que maneira viajaste
talvez num sonho agitado de gaivota
em águas mansas
no coral da blusa cingida nas curvas do rio
Nem sabes de que maneira viajaste
entre o decote e o pescoço esguio
A asa negra que subtilmente
espreitava debaixo da seda
deslocaste.
Nem sabes de que maneira viajaste
quiseste afastar a poluição do rio
e afundar o mundo em ancas poderosas
A água galgou as margens
e tu sentiste
a vibração do verde - esmeralda da poesia
num ousado olhar que no navio corria
a fazer-se ao mar
num sonho agitado de gaivota

Teresa Almeida


quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Poesia do fado


Janelas do fado
Portas da poesia
Aqui fui chamada um dia
Ao fado declamado
Trinando de alegria
Num tom bem musicado
Um Fado e Poesia

Trouxe as palavras ao Fado
Dando voz aos meus sentidos
Deixei as mágoas de lado
E os sentimentos fingidos

Aqui tudo é oração e é prece
Rezada com a voz na alma
Altar de poesia acontece
É o fado que o poema salva

Tragam o fado para a poesia
Oh guitarras venham trinar
Cantemos todos até ser dia
O poema a declamar

Poetas e Fadistas do coração
A Manuela assim lhes chama
É a voz saudosa da emoção
Que a poesia assim proclama

anabarbarasantoantonio


Levarei o xaile negro

dos ombros da minha mãe
vou pedir-lho emprestado
abrilhantar a tertúlia poética
desfiar franjas de saudade
e memórias que desfalecem
nos xailes da mocidade

Levarei a ternura embrulhada
no xaile da minha mãe
quando as guitarras gemerem
quero aquecer-me em poesia
e em pedaços de carinho
que o xaile negro tem

A magia do teu olhar azul
levarei no meu gravado
porque esta noite, minha mãe
é por amor que se canta o fado
e o beijo que hoje me deste
e o teu meigo rosto  molhado
no xaile negro levarei

Teresa Almeida





quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Poema incompleto

Não sei se entre nós
nasceu primeiro o beijo ou a palavra
há palavras com instinto de labareda
se não forem mordidas
provocam  incêndios
Não sei qual foi o primeiro registo dos nossos lábios
beijos e palavras espalharam-se em nós
naturalmente
beijos e palavras mantêm-se acesos
num intenso assalto de olhares claros e cúmplices
ardendo em incompleto poema

Teresa Almeida