domingo, 17 de setembro de 2017

Assomadeiros Resbalinos


Ardo ne l deseio de bolar,
inda que saba q´hai assomadeiros resbalinos,
altas faias an que me puoda prender,
i nuobos i retrocidos caminos que l suonho precura
i anque l miu pensar
quede colgado i tembre mirando l peligro,
sien la palabra q´amente
la berdade i l resfuolgo de l miu sentir. 

Tengo ganas de bolar.
Esta paixon ye cumo un riu de querer fondo,
custoso de secar. Chama-se lhéngua mirandesa.
Solo s’astrebe quando se sinte la bertige de la caída,
mas ye ende que l bolo lhieba gusto i plenitude.

Talbeç seia un bolo maternal, buído na calor
i ne ls beisos de la fala
quando inda nun se sabe falar. Cuido you
que quien me dou de mamar, dou-me, tamien,
este deseio, sien frenos, de sbolaciar.

Fago l risco nas alturas,
porcuro fuorça nas alas que la curjidade me dou.
Nun quiero quedar a meicamino,
quiero antrar ne ls sonidos i na guapura deste falar.

La felcidade stá an anteimar.

Mirantes escorregadios

Ardo no desejo de voar,
ainda que saiba que há mirantes escorregadios,
altos penhascos em que possa encalhar,
e até novos e retorcidos caminhos que o sonho procura
e onde o meu pensamento
fica suspenso e treme ao olhar o precipício
sem a palavra que diga
a verdade e o ímpeto do meu sentir.

Tenho fome de voar
por dentro da tua simplicidade e beleza.
Esta paixão é como um rio de querer profundo,
difícil de secar. Chama-se língua mirandesa.
Só se ousa quando se sente a vertigem da queda,
mas é assim que o voo ganha gozo e plenitude.

Talvez seja um voo de colo, bebido no calor
e nos beijos da fala
quando ainda não se sabe falar.
Quem me deu de mamar, deu-me, também,
este desejo, sem freios, de esvoaçar.

Traço o risco nas alturas,
procuro força nas asas que a audácia me deu.
Não quero ficar a meio caminho,
quero entrar na sonoridade e na beleza deste falar.
A felicidade está em ousar.

Teresa Almeida Subtil
(in Rio de Infinitos/Riu d'Anfenitos)


Dia da Língua mirandesa.

4 comentários:

  1. Tento perceber esse apego à língua mirandesa, complemento com alguma pesquisa, acho que faz todo o sentido.
    O poema é muito bom, Teresa. Parabéns!

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  2. "Ardo no desejo de voar". Fiquei logo presa ao começo do poema, Teresa. Ousar levantar voo. Não resistir à espessura das sombras sob os pés...
    Tão belo!
    Uma boa semana.
    Um beijo.

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  3. Olá, querida Teresa, lindo 'Mirantes escorregadios', temos de ir... de colocar em prática nossos sonhos para não trair nossa felicidade.

    'Traço o risco nas alturas,
    procuro força nas asas que a audácia me deu.
    Não quero ficar a meio caminho,
    quero entrar na sonoridade e na beleza deste falar.
    A felicidade está em ousar.'

    Perfeito, grande beijo!

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  4. Um poema absolutamente maravilhoso... que de uma forma apaixonante, nos agarra da primeira à última palavra...
    Parabéns, pelo magnífico e inspirado trabalho, Teresa!
    Beijinho!
    Ana

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