segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A NEVE PARA LÁ DA CORTINA

Para lá da cortina, para lá da vidraça
outras cortinas quase escondem a paisagem
e caem leve, docemente

Apesar da amargura que deixa adivinhar
não posso deixar de me deslumbrar
com a beleza dos fiapos de neve
que descortino para lá da vidraça

Sei que quando ela se levantar
arrastando 91 anos de beleza e graça
vai gostar de ver a neve para lá da cortina
e na lareira o fogo a crepitar

E o sorriso que adoro ver
num rosto de minha mãe
no meu eu vou ter

Ágil, bonita e leve levantava-se de manhã
a aquecer o leite, a fazer o lume e as torradas
porque as netas tinham que ir bem alimentadas
E sempre a resmungar lá iam despachando o pequeno almoço
Levantar-me primeiro que ela, foi o maior sinal
o sinal de que a vida a venceu

Quem acordava o meu sorriso era ela, a minha mãe

E agora olho através da vidraça
e parece que a neve foi um sonho derretido
 no ninho do passarinho
abandonado no outono da figueira
Gostei tanto de o ver de flocos brancos enfeitado
junto ao quarto, para lá da vidraça
ELe que em tempo alto também madrugava
e em canto afinado abria ao raiar da manhã
a alegria que contagiava

Dou por mim a pensar nas mudanças da vida

Ela chegou agora mesmo
o sorriso e o riso abertos, oferecidos
tinha visto a neve e, com a chama de tempos idos, disse:
Ah! Estes rachos, tão fortes, não foste tu que os trouxeste!

 Teresa Almeida 16.01.2011


4 comentários:

  1. Além da beleza poética, não pude deixar de sorrir com "estas lembranças" e a descrição de momentos tão ternurentos referentes a uma senhora de 91 anos. Consegui estar lá!!!
    Bjuzzz, minha amiga :

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  2. Obrigada pela tua sensibilidade,ternura e ainda pelo teu sorriso.
    Também me lembro muito de ti, aqui, entre nós.
    Escrevi enquanto nevava, mas foi um tempo tão breve que, na foto, não apanhei quase nada.:)
    Bjuzz querida amiga.

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  3. O branco da neve a acordar os sentidos e o branco da ternura no carinho de e para a mãe.
    Os tempos vão mudando as mãos que abraçam os rachos pesados, mas os tempos não mudam a brancura...

    Um abraço,

    Adelaide

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  4. O branco carrega uma enorme simbologia.
    Até a natureza fica mais bela vestida de branco. Parece despertar em nós os mais puros sentimentos.
    Beisicos Delaidica.

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