segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Paixão Açoriana


Acabei de podar as hortências do jardim
 as do lado nascente, onde se dão bem
e sorriem a quem passa em cobiçado olhar
 
no pequeno espaço elas são um afeto desmedido
uma paixão açoriana que me enfeita o verão
cantam o Outono e ruborizadas tremem
até ao enorme arrepio das primeiras geadas.
 
cai a tarde enquanto vejo uma película de natal
e há hortênsias secas  nas jarras transparentes.
Tens uma vida invulgar, para mim, surpreendente
já estiveste no Faial? Viste a magia dos muros floridos?
 
Como podes garantir que não voltarás aqui ou ali?
Coisas de astrólogo, já se vê. Eu não garanto nada!
Quero voltar à ponta do sossego e à ponta da madrugada.
 
Teresa Almeida
 

domingo, 8 de dezembro de 2013

Sem medo


sei que há trambolhões desesperados

mas eleva-te acima, suspende-me
os meus pés estão pesados e a escrita
anda perdida no nosso descontentamento
caiu contigo da árvore que de fartura
atraiçoou o teu passo num galho mais frágil
 
sinto-te mais em mim mesmo afastado
ainda quero ter o teu voo ágil e a rima
e a palavra que tinha o sabor intenso e breve
do abraço justo, impaciente, delineado
no meu corpo desperto, em desassossego
 
quero ver-te no meio do bulício, sem medo
partilhando os sabores da amizade
quero voltar a sentir-te solto e leve
o pé em jeito de apanhar o primeiro acorde
e a vida em laivos de felicidade 
 
Teresa Almeida

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Queda outonal



enlaço-me num emaranhado de folhas outonais

as mais belas

cachos de uvas reluzem ressequidas entre elas

a parreira que plantaste enroscou-se na grade do tempo

ferral de rosa -  as minhas uvas preferidas

não chegámos a colhê-las

sabes como gosto de as debicar como se fosse um pardal

mas deixo o cacho sempre elegante

as rosas, a jusante, regressam em fogo outonal

 

não esqueço o sofrimento à solta no hospital

nem os beijos que te levei e os que te darei

não esqueço o teu rosto comprimido

nem a queda do alto figueira do quintal

nem o pavor no meu peito sem abrigo

não esqueço este Setembro que se verte

na doçura dos figos que quiseste oferecer

sobe-se por amor e desce-se no espanto da dor

a vida é bela e traiçoeira, meu amor.

22-09.2013

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Porto poético



Deixa-me apalpar a magia da cidade           
as cores maviosas em que a respiras
azuis, vermelhos e amarelos acesos
deixa-me apalpar o namoro do teu olhar
os teus passos amorosos, descalços
e os abraços nas pedras da calçada
a história calcorreada

em cada anoitecer as cores adormecem amadas
há melodias íntimas que cada um conhece
uma prece que se canta e saboreia em cada esquina
há sobreposição de sentidos melódicos
nas pinceladas que esbracejam de afeto
deixa-me apalpar a cidade em cada recanto ou beco
em ti descubro-a tal qual a conheci
deixa-me adivinhar as estrelas que romperam as janelas

deixa-me inebriar na pintura que não quero entender
nem sequer comentar, quero apenas sentir e desejar
o teu poema pictoricamente épico
deixa-me penetrar a eloquência do teu versejar
são torres, são rios, são pontes, são navios
este  é o país que aqui se canta e diz
é o Porto poético!

Teresa Almeida

(Pintura de Santiago Belacqua) 
 

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

se me dizes: vem


fico perdida nos ventos e na magia dos sentidos
saio da história e deixo o livro em suspenso
da página levanto o olhar e perco o timbre habitual
desenho o mar imenso nas asas do verso matinal

se me dizes: vem
penetro a melodia desta manhã pardacenta
embarco na poesia desta incauto momento
acredito numa ponte entre todas as margens
e em navios aportando auroras de novas viagens

Teresa Almeida


domingo, 6 de outubro de 2013


Fascínio
 
 
Não sei se o fascínio vem do brilho dos solitários

com coloridas folhas de parreira

se da beleza translúcida da jarra verde

comprada para o casamento da avó

se da travessa esmeralda, enfeitada

com uvas de rei da vinha da faceira.

 

Ou será apenas e só um poema

que vive na sala um enredo outonal

filtrado à hora mágica do sol pôr

ou a saudade esgueirada dum olhar amigo

o valor da pena esvoaçante de ave

pintada num elegante vaso antigo?
 

Teresa Almeida

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Amor i delor



 Purmeiro fui l silenço i l coraçon cheno d´ancredelidade i cada beç l spanto se m´acercaba más.

Apuis las palabras salírun cumo l carambelo que zimpou pula nuite an que te fui a ber. Ua de las piores de la tue bida. Ua daqueilhas apuis que l fuogo treiçoneiro te lhebou un de ls tous crabos, un de ls botones que salírun de drento de ti cun amor i delor. Parece que l delor faç parte de... la bida i anda mui acerquita de l´amor para que naide seia purfeito. Fúran tantas las antemidades que ambas a dues arranquemos de l peito cheno de ls nuossos afetos, porque l´amor bota-se afuora a cachones i ye cumo un sistema de basos quemunicantes. I ls filhos andában al meio de to tas cumbersas, anquanto las tues manos halbelidosas botaban quelores al miu pelo, anque la fuorça de l tiempo anteime an le botar centeilhas de lhuna.

Fui a la hora de la lhuna que te fui a ber i até eilha, de tristeza, se scundiu i la truona apagou las lhuzes artefeciales Quaije nun te bi, mas ne l nuosso abraço senti l´ antemidade i l carambelo de l delor. Nien sequiera ancuntrei las palabras ciertas para te dezir.

Teresa Almeida

Primeiro foi o silêncio e o coração cheio de incredulidade e cada vez mais o espanto me invadia.
Depois as palavras saíram como o granizo que caiu pela noite em que te fui ver. Uma das piores da tua vida. Uma daquelas depois que o fogo traiçoeiro te levou um dos teus cravos, um dos botões que saíram de dentro de ti com amor e dor. Parece que a dor faz parte da vida e anda tão próxima do amor para que nada seja perfeito. Foram tantas as intimidades que ambas arrancámos do peito cheio dos nossos afetos porque o amor transborda e é como um sistema de vasos comunicantes. E os filhos andavam no meio de todas as conversas, enquanto as tuas mãos habilidosas jogavam tons no meu cabelo para contrariar a força do tempo que entra nele em raios de lua.
Foi à hora da lua que te fui ver e até ela, de tristeza, se escondeu. E a trovoada também apagou as luzes artificiais. Quase não te vi, mas no nosso abraço senti a intimidade e o gelo da dor - nem sequer encontrei as palavras certas para te dizer

sábado, 7 de setembro de 2013

Deixo-me ficar

Deixo-me ficar
pendurada em doce madrugar
nascido de um romance excessivo
entre o sol e o rio - em noite de luar
debruço-me em picos de luz
esqueço a loucura a dilacerar o tempo
deixo-me ficar
bebo a paz e a magia do momento
sacrário de eterno contentamento.


Teresa Almeida

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Chichen Itzá - México


Em Chichen Itzá mergulhamos num jogo de sol e sombra, obra de sabedoria humana que parece transpor-nos a um patamar divino. Em locais com esta magnitude apetece-nos estabelecer um jogo com a vida, libertarmo-nos  dos escombros e subir ao cume da espiritualidade. 
Serpenteavam entre nós jovens iguanas que, em manobras circenses faziam piruetas, subiam as paredes e ficavam na brasa do calor da tarde a observar-nos lá de cima - do alto das pirâmides maias. Esbugalhámos os olhos de espanto e com elas partilhámos espaços de liberdade que lhes pertencem por direito próprio. As mais velhas e corpulentas parecem ter a idade das pedras e, como legítimas guardiãs de tesouros milenares,  mostravam uma surpreendente atitude de vedetas no à vontade com que se expunham aos curiosos "paparazzi". A expressão do olhar cativava-nos e aproximava-nos - como se fossem detentoras de eternidades de paz.
Em Chichen Itzá deixei o medo e o arrepio que sentia quando me cruzava com as esquivas osgas do meu quintal. Se com elas pudesse cruzar o olhar, creio que o faria - agora - com outra familiaridade.


An mirandés

An Chichen Itzá hai un jogo de sol i selombra, obra de sabedorie houmana que parece lhebar-mos a un terreiro debino. An lhocales cun esta grandura apetece-mos fazer un jogo cula bida, lhibrarmos-mos  de ls sbarrulhos i oupir al pico de la spritualidade.
Lhougo a l´antrada arregalamos ls uolhos de spanto: sperában-mos taludas eiguanas que parecien arrimar-se a la l'eidade de las piedras. Cumo legítimas guardianas de tesouros milenares, amostrában als curjidosos "paparazi" spantosos modos de streilhas. Sous uolhos chamában-mos, cumo se l sou mirar tubisse an drento eiternidades de paç.
Las mais moças rabeában antre nós, fazien hablidades, oupian las paredes i quedában na brasa de la calor de la tarde a ouserbar-mos alhá de riba - de l alto de las pirámides maias. Cun eilhas partelhamos spácios de lhibardade que le perténcen por dreito própio.
An Chichen Itzá quedou l miedo i l arrepelo que sentie quando me cruzaba culas fugidas osgas de l miu quintal. Se cun eilhas pudisse cruzar l mirar, cuido que l fazerie - agora - cun outra familharidade.

Teresa Almeida


 

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Murcharam as rosas

Li-te a amargura e a saudade numa tarde quente de verão
a sensibilidade e a desilusão no verso desfeito e abandonado
Despontavam auroras num tempo perturbado de ausências
e de morangos vermelhos e carnudos atraiçoados no sabor.
Li-te nos lábios a dor da perda e o gelo das palavras
 as sentidas idas aos recantos e encantos do nordeste.
Li-te a ternura das rosas decepadas em breve e sofrido caminho
 um  caminho que  perdeste e sentiste no voo planado do abutre
na alegria berrante das mimosas que vaidosas enfeitiçam os matagais.
Li-te o desgosto mastigado ao lume de uma tarde de Agosto.

Murcharam as rosas que tanto amaste mas sinto que afagas a saudade
e buscas a essência do perfume nos espinhos de agrestes roseirais.



Teresa Almeida

quarta-feira, 10 de julho de 2013

A garrafa de jeropiga


 entrei na adega e já adivinhava               
um tesouro nela agrilhoado
a sete chaves
...
as chaves de um chamamento amigo
a manobra na fechadura
ouvia-se no cimo do povo, certamente
gostei de franquear o portal de traça antiga
com tábuas cosidas a pregos por mãos de artista

entrei no empedrado miúdo do corredor enviesado
que parecia ter crescido com os dias
lenta e amorosamente
arrolhados estavam néctares apetecidos
ancestrais saberes escondidos

em garrafas e canecas demorava o olhar
concupiscente
mas logo seguia com avidez
o teu andar de contentamento e o sabor da vida
pairava no primor de cada detalhe
no suporte de cada garrafa especial
esculpido em madeira de árvore antiga

seguia entre teias de afeto
tecidas caprichosamente
enleava-me nos fios e não me importava
desfrutava do enredo, da ocasião
sentámo-nos no chão, junto ao pipo
e o ar de verão entrava pela janela de pedra
sem vidraça nem portada

 abriste a torneira, segurei o copo
o vinho e a conversa sabiam bem
e na naturalidade daquela tarde
como a folha de hedra enleada
desfrutava dos prazeres da adega
algo invulgar noutros tempos

não sei como, mas trouxe a garrafa de jeropiga
guardada a sete chaves no pensamento
Teresa Almeida

sábado, 29 de junho de 2013

Tempo de mim

Deslizam nuvens nos lenços do meu vestido
 
folhos rubros em dia pardacento
 
é um dia gigantesco este
 
em que se desfolham folhas de vida
 
nos versos que pela noite se vão erguer
 
e renascer fervilhando em tertúlias de poesia
 
cantando um Porto cinzento sim
 
mas poético e glamoroso
 
e é nesta alegria que me encanto e desço
 
e troco cumplicidades com a vizinha
 
que afinal mal conheço
 
os rostos agarram a frieza do betão e a pressa
 
não se compadece nem espera que a vida
 
se solte desinibida, confiante em desabafos
 
esparsos e breves sentires
 
o sol começa a aquecer e a assomar-se no olhar
 
e como um cálice de vinho fino que partilhássemos juntas
 
os olhos brindam a alegria deste encontro
 
o primeiro na escada derradeira
 
e perco a pressa, deixo-me estar
 
estou aqui por pouco tempo, mas é sempre tempo
 
de sermos gente, de nos olharmos e vermos
 
que afinal abrandar o passo pode ser um passo em frente
 
e eu hoje que tenho pressa demoro mais um pouco
 
porque tenho sempre tempo para mim
 
e é quando me dou que eu me pertenço

Teresa Almeida
 
(in Antologia da Moderna Poética Portuguesa)
 

sexta-feira, 28 de junho de 2013

hoje apetece-me cantar


fiquei demorando o olhar
para perceber o que se está a passar

Duce ou Dulcineia tanto faz
não rasgues os teus versos querida
não faças chorar a alma da gente
o verso é a própria vida

hoje apetece-me cantar
como o rouxinol na noite perdida
por ti vou cantar baixinho
gemer de amor e saudade
soltar rimas em liberdade

e nos versos tristes de Florbela
deixar sonhar D. Quixote

perseguir moinhos de vento
com ousadia
a galope

Teresa Almeida

terça-feira, 18 de junho de 2013

Deixa-me ficar


 Senti fremente o teu apelo
leve rodopio em meu ser
furtiva promessa divina

eu quero deste jeito sagrado
eu quero o teu querer

Deixa-me subir embriagada
ao meteórico instante
ao alto da palavra

Deixa-me lá ficar
suspensa no teu toque preferido
em sintonia melódica
contigo

Teresa Almeida


 

 

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Tudo é voz e caminho


 

                                                 Foto de Manuel Pires
 

É para lá dos montes que se ergue um comando destemido 

a exorcizar o medo 

um traço rápido e ajustado de pedra afiada

ninguém tem a última palavra.

Na incerteza buscam-se os astros 

na rudeza do percurso, na avalanche da desgraça

tudo é voz e caminho.

É na convulsão que entra o movimento.

Renascidos no espanto e na esperança 

irrompe a energia, a evolução 

apoteose de vida. 

Firmeza na ação, elegância no gesto.
 
 
Teresa Almeida
(in "Antologia da moderna poética Portuguesa)

 

 

quinta-feira, 23 de maio de 2013

À flor da pele



Sentir-te a pele é a sensação mais intensa
não sei de palavras que toquem este fogo
um toque ao de leve em jeito de conversa
e um arrepio a percorrer o corpo todo

talvez o olhar se quisesse já cruzado
num diálogo quase incerto, impossível
sonho breve num desejo acordado
poema louco, verso intenso e irreprimível

sem disfarces num abraço abandonado
seguiram os lábios o apelo mudo e cego
e as mãos uma viagem desconhecida

O peito levantou-se firme e eriçado
amando a noite e o desassossego
e esta febre entre estrelas renascida

Teresa Almeida

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Da minha janela



Abro a melodia da manhã que me floresce à janela
pensamentos escusos anulam-se nos cortinados da noite
deixo-me seduzir em promessas de cerejas carnudas e suculentas
com sabor a beijos teus

lá ao fundo, no remanso do rio, ecoam românticos fluidos musicais
Vivaldi toca eternidades de prazer em fogosidades primaveris
escapam-se algumas notas de rodapé

nem quero acreditar
em geadas tardias e em ventos desbragados
a bailar na cambraia fina da minha cerejeira
de um só golpe poderão desafinar a sinfonia
do festival dos sentidos

abraços pendurados e notas soltas de uma sonata de verão
começam a assomar-se na minha janela

Teresa Almeida

terça-feira, 23 de abril de 2013

Terra Mítica



 Hoje, passeei-te na fantasia das cores de Abril
brinquei o olhar no rio despido de traições
espelhado na candura de renovadas promessas
...
porque te recusas a adormecer na nossa desilusão
porque nos queres dizer que é de dentro
que o renovo traz a energia, porque te apaixonas em cada dia
e não desistes de te vestires de Primavera em folhos e folhos de alegria
e em bordados de alvíssaras que pontuam caminhos de obstrução

desejei-te magnífica ao alvorecer de um tempo acordado
abracei a ousadia de um arco íris mergulhado em devoção
porque a batida de Abril cumpre-se em ti
uma linguagem telúrica a repercutir -se em nós
e eu sigo pelos caminhos do planalto e venero-te emocionada.


Tierra Mítica

 

Hoije passeei-te an la fantesie de las quelores de Abril
joguei l mirar ne l riu znudo de traiçones
spelhado na candura de renobadas pormessas

 porque nun te quieres drumir na nuossa zeiluson

porque mos quieres dezir que ye de drento

 que l renuobo trai l'einergie, porque t'amboubas a cada die
 i nun zistes de te bestires de Primabera an remissacos d'alegrie
 i an bordados de perpinhas que zéinhan caminos atalacados

 

 deseei-te guapíssema al amanhecer dun tiempo spertado
 abracei l'ousadie de la cinta de la bielha margulhada an deboçon

 porque la batida de Abril cumpre-se an ti

 ua lhenguaige telúrica a retumbar an nós
 i you sigo puls caminos de l Praino i benero-te eimocionada


Teresa Almeida

quinta-feira, 18 de abril de 2013

VÉNUS MUTILADA


Só podes ser o delírio de um poeta
que em noite de inspiração
deusa te sonhou
e nas asas verdes da tentação
duramente esculpiu


Fez -se ao largo num instante iluminado       
e surpreendido em teias de sedução
por artes divinas cativado
harmoniosamente te cinzelou

 
Um sonho moldado em pedra Donai
um olhar fechado, átomo virtual
Em toques de bisel te mediu o encanto
sentindo o pranto estático e real

 
Perseguiu-te inteira, na plenitude vital
em sopros de carinho te aclarou
centelhas meteoríticas de esperança
na tua pele abriu

 
Só podes ser um sonho fidedigno do artista
que em ti a poesia primordial
duramente esculpiu

 
Mas no sonho está insatisfeito o tempo
e a poesia, qual Vénus mutilada
explode eternamente sofrida
inacabada

Teresa Almeida
(Escultura de António Afonso)

 

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Apresentação da autora, Teresa Almeida e obra “Ousadia” – Casa Barbot – Vila Nova de Gaia



Era uma vez (todas as histórias têm sempre uma vez) uma menina de olhos esperança que se cruzaram em âmbito de trabalho. Algum tempo vivenciado com alma, com empenho, com vivacidade. A inevitável separação mas sem que houvesse vontade de perder o contacto. Alargou-se esta cumplicidade na pessoa da sua mãe, Teresa Almeida, a autora aqui presente.
Depois, foi a troca de ideias, a partilha de sentires, o incentivo para “ousar” divulgar os seus escritos. E o livro que deu à estampa, já estava inscrito na sua matriz genética.
Os poemas imagéticos fluem como como pinceladas em tela vazia, umas mais intimistas, outras mais soltas, colorindo a paisagem que é, em si mesmo, a sua pessoa.
Uma poesia das sensações, mesclando o visual, o auditivo e o olfativo no percurso vivencial de menina, moça e mulher. Mulher de pleno sentido, inteligência de emoções nos cenários com que coabita ou que nos faz vislumbrar nos versos ricos de imagens, enraizadas no telurismo próprio das suas origens e no mundo mais citadino por onde também deambulou e deambula frequentemente.
Estive presente no lançamento do seu “Ousadia”, em Miranda do Douro. Acompanho a sua poesia mas, sobretudo, conheço o seu deslumbramento por este novo mundo que são as pessoas e as palavras que as definem.
Do virtual ao real, tudo é como um passe de mágica quando a cumplicidade é suportada pela amizade. Assim, não podia deixar de estar presente nesta apresentação, em tão belo espaço, quase mítico.
Também não esqueço a tua presença no lançamento do meu “EM SUSPENSO”… Já passaram quase dois anos, mas o ontem é sempre um hoje para nós…
Parabéns, uma vez mais, por nos presenteares com a tua “Ousadia”, uma obra de audaz fantasia. Cumprimento a amiga, a autora, a mulher. E as palavras que são o teu poema/vida! Beijo-te, Teresa Almeida.

Odete Ferreira, 22-02-13
Magestic, Porto
- Mesa: Manuela Bulcão, Teresa Almeida, Odete Ferreira, José Sepúlveda. 

sábado, 30 de março de 2013

La mie rue

 
Rua da Rebola - Lagoaça
(Foto de Dalila Tomás)


A minha rua

A minha rua cobre-se de pétalas
coloridas e macias,
nasce o trigo nas janelas
e o cheiro silvestre das arribas.
Mantas alvas penduradas dão vivas.

Na minha rua sobe a música aos céus,
sente-se o repicado dos sinos
que vem do coração da aldeia.
Mesmo indo lá poucas vezes
sempre em mim os ouvirei.

Parece que queremos prender
o encanto da infância,
os primeiros passos na vida,
o calor, o riso, o olhar dos vizinhos
e as vozes que nasciam de madrugada.

Todos temos uma rua
e mesmo sem darmos conta
é ali que moramos,
como se brotassem primaveras
e sinos repicassem de alegria
nas pedras da calçada.



La mie rue

La mie rue inche-se de pítulas
queloridas i dóndias,
mana l trigo de las jinelas
i l cheiro silbestre de las arribas.
Mantas albas colgadas dan bibas.

Na mie rue chube la música als cielos,
sinte-se l repicado de las campanas
a benir de l Sagrado.
Mesmo q´alhá baia ralas bezes
siempre ne l miu coraçon las oubirei.

Parece que queremos assigurar
l ancanto de la nineç,
ls purmeiros passos na bida,
la  calor, la risa, l mirar de ls bezinos
i ls bózios que nacírun de madrugada.

Todos tenemos ua rue
i mesmo sien mos darmos de cuonta
alhá moramos,
cumo se nacíssen primaberas
i las campanas repicássen d´alegrie
nas piedras de la calçada.

Teresa Almeida Subtil



Rua da Malhada

Lagoaça

quarta-feira, 20 de março de 2013

Primavera

Este encanto que tu dizes
e as palavras que me cantas
quando em Março te levantas
e me abraças devagarinho

Este feitiço que espalhas
em explosões de alegria
este ritmo este riso esta fantasia
é um devaneio primaveril
num mundo insano

é até pecado sentir-te desta maneira
mas quero o teu ar de feiticeira
à solta no meu canteiro

Teresa Almeida

terça-feira, 19 de março de 2013

Pai

Deixo-te um beijo e uma flor
a ternura e a emoção
desta viagem sem tempo

deixo-te a alegria que guardo
de ti em cada momento
e esta segurança em mim

e este olhar raiado de amor
inteiro na minha mão
pai, deixo-te esta flor

e um beijo meu que colhi
no meu passo no teu jardim
nas flores que deixaste para mim

Teresa Almeida

sexta-feira, 15 de março de 2013

Toda eu



Volúpias alvas, translúcidas, cobrem o meu corpo
quimeras  que a noite em mim sonhou
madrugadas irreais  acordam os picos da exaltação
e aclaram os tons em que a noite se deitou
as colinas desnudam-se fogosas num despertar dolente
o vale guarda ainda o meigo humidificar dos primeiros rebentos
força de vida a raiar lentamente
evoluem e fluem as cores do meu desassossego
vertidas em telas que o imaginário consente
o mar, a terra e o céu sou toda eu

Teresa Almeida


segunda-feira, 11 de março de 2013

Vale da Vilariça


Escorre-me o tempo entre os dedos
a neve é já rosada em picos traiçoeiros
racha-se de saudade a árvore dos segredos
e  veste-se o campo de flor de amendoeira

São de púrpura os risos da manhã
aflorada em vales intumescidos
são de alegria os cantos que se levantam
e verdes os matagais dos sentidos

Escorre-me o tempo entre os dedos
rejuvenesce o encanto da velha canção
insinua-se a cromática da Vilariça
e a tela acende-se na minha mão.
Teresa Almeida

sexta-feira, 8 de março de 2013

Mulher



Desnuda-te alma minha
rasga as nuvens que te toldam
contorna os pedregulhos
... e mesmo que nos mais aguçados te piques
lembra-te que são efémeros
imponderados
ergue a coragem às alturas
solta a energia que te anima
és mãe, filha, rainha do universo
caminha e toca a finura do alvorecer
ousa ser onda bravia e verdadeira
mulher inteira
veste-te de todas as cores
sente a melodia do teu céu
todos os dias
caminha na imensidão do amor
arrisca um mergulho na vida
privilégio teu