sábado, 29 de junho de 2013

Tempo de mim

Deslizam nuvens nos lenços do meu vestido
 
folhos rubros em dia pardacento
 
é um dia gigantesco este
 
em que se desfolham folhas de vida
 
nos versos que pela noite se vão erguer
 
e renascer fervilhando em tertúlias de poesia
 
cantando um Porto cinzento sim
 
mas poético e glamoroso
 
e é nesta alegria que me encanto e desço
 
e troco cumplicidades com a vizinha
 
que afinal mal conheço
 
os rostos agarram a frieza do betão e a pressa
 
não se compadece nem espera que a vida
 
se solte desinibida, confiante em desabafos
 
esparsos e breves sentires
 
o sol começa a aquecer e a assomar-se no olhar
 
e como um cálice de vinho fino que partilhássemos juntas
 
os olhos brindam a alegria deste encontro
 
o primeiro na escada derradeira
 
e perco a pressa, deixo-me estar
 
estou aqui por pouco tempo, mas é sempre tempo
 
de sermos gente, de nos olharmos e vermos
 
que afinal abrandar o passo pode ser um passo em frente
 
e eu hoje que tenho pressa demoro mais um pouco
 
porque tenho sempre tempo para mim
 
e é quando me dou que eu me pertenço

Teresa Almeida
 
(in Antologia da Moderna Poética Portuguesa)
 

5 comentários:

  1. Gostei muito do teu poema e do "vinho fino" que ele contém...
    Mas a tua poesia já é vintage...
    Teresa, minha querida amiga, tem um bom resto de domingo e uma boa semana.
    Beijo.

    ResponderEliminar
  2. Como bem cantas o tempo de encanto... de sermos gente!
    Um abraço, que no calor do seu retorno, me faça sentir gente...

    ResponderEliminar
  3. Teresa, Querida

    O Amor é assim, como o "[...] Porto cinzento (...)

    poético e glamoroso,(...)

    porque tenho sempre tempo para mim

    e é quando me dou que eu me pertenço".

    Uma saudação (louvor) especial á preciosidade deste teu Poema.



    Beijos


    SOL

    ResponderEliminar
  4. Um poema todo ele de doação, partilha, cumplicidade...VIDA.
    Há momentos no tempo que revertem os tempos desumanizados...

    Apreciei imenso este "namoro" com a tua identidade...

    Bjuzz, amiga Teresa :)

    ResponderEliminar
  5. Descobrindo tuas letras e o imenso capital de literatura que elas contém. Relendo este teu belo poema, percebi que ele é uma crónica em versos. Uma crónica-poema que fala de cumplicidades espontâneas, de entregas sans arrière-pensées, fortuitas, naturais; são pequenas descobertas que se interagem para tecer uma admirável tapeçaria de vida, de maneira de ser.

    Li, reli e talvez que lerei ainda outras vezes este belo texto teu, Teresa; ele é enriquecedor e, ao mesmo tempo, saboroso. Assim como o dístico final que o arremata, uma verdadeira "chave-de-ouro" que nos leva à reflexão mais profícua.

    Parabéns, um abraço muito amical,

    André

    ResponderEliminar