sexta-feira, 3 de junho de 2022

A talho de foice!

"Dia da criança."

O soldado atirador sobreviveu à guerra na Guiné e, na recente pandemia, após 80 dias de luta com a Covid 19, voltou à vida. Reativou o restaurante de sucesso que havia passado em situação de doença. "Oh, eu gosto disto e não conseguiram, entretanto, manter a qualidade nem a clientela". Qualidade que, volta e meia, gostamos de comprovar. Procurei conhecer o organigrama (estrutura militar) do pessoal mobilizado para as províncias ultramarinas: batalhões, companhias, pelotões, secções e ainda um espaço de restabelecimento e ajuda à população ( em Varela) a que chamavam "psícola".

Do aquartelamento em Suzana, o nosso soldado regressou elegante. Ele e os outros. Lembram a falta de água, a escassez de alimentos, a necessária negociata com o inimigo para aquisição de bens essenciais, etc.

Os combatentes do mesmo pelotão - depois de sentirem o cheiro a pólvora, terem nadado entre crocodilos, voarem numa avioneta a que caiu uma porta, comerem rações de combate por demasiado tempo, patrulharem o quartel com o som de morteiros por perto - sentem-se família. O capitão procurou regressar com os homens que levou, mas ele mesmo foi abatido numa operação militar. É uma mágoa sem fim. E tudo isto em nome do poder e do território.

A talho de foice, veio a guerra na Ucrânia. Cessar fogo! Leio no meu telemóvel. Será certo? Seria memorável se a paz fosse celebrada em dia da criança. Elas a quem toca a fatia de dor mais pesada.

Viajo pelo Douro com um ex-combatente. Vou lavando as vistas, conversando e escrevendo. É o habitual. E levo, naturalmente, miminhos, de apurado sabor, para as minhas crianças: nêsperas, cerejas, damascos e pêssegos.

Já estamos em Alcanizes. Há outros caminhos, mas atravessar este cibo de Espanha para regressar a casa, faz parte das nossas preferências. Já vejo os púcaros de Moveros, mas hoje só olho. Somos raianos.

Teresa Almeida Subtil

01.06.2022


15 comentários:

  1. Olá, Olá!!!
    Querida Teresa que boa surpresa!
    Sei que tem estado a tratar de assuntos da sua vida,
    mas estamos aqui cheios de paciência e ansiedade
    à sua espera.
    Este seu texto vem tocar em feridas que, mesmo que doam,
    têm de ser relembradas. A Guerra do Ultramar transtornou
    e/ou ceifou a vida de muita gente, em especial dos jovens de
    então.
    A ligação com o que se passa agora, com a Guerra na Ucrânia, tinha de ser feita.
    E a Paz, fundamental para que as nossas crianças tenham uma vida saudável e de justiça, tem de ser lembrada todos os dias.
    Beijinhos para si e para os netinhos.
    Olinda

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  2. Olá, querida Teresa, li com atenção que o texto merece, gostei muito da leitura, que história! E fiquei a pensar se a paz viesse no Dia da Criança!! Seria uma dádiva, mas não amiga, não sei onde vai parar isso tudo.
    Que tenhamos sorte!
    Um bom fim de semana,
    beijinhos

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  3. Também homenageei os nossos combatentes do ultramar que vivenciaram aquela guerra bruta e inglória...
    Perante as circunstâncias, é inevitável recordar. Tive familiares e amigos nela...
    E esta semana continuo refletindo sobre guerra no meu blogue...
    Gostei de encontrar o teu ´post' no alto da minha 'lista de afinidades'... Sabes que gosto de te ler e estou esperando com muita curiosidade a tua obra.
    Tem um mês de Junho muito produtivo agradável feliz. Abraços
    ~~~~~~~

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  4. Boa tarde. Parabéns pelo seu trabalho e homenagens. Gostaria de lhe convidar a conhecer o meu Blogger. Caso goste podemos um seguir o Blogger do outro.

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  5. Bom dia de domingo, querida Teresa!
    Ah! Se a paz reinasse de vez na Ucrânia e na humanidade.
    Conheci o Monumento aos Combatentes (Ultramar) e quando passava no monumento dos Pracinha no RJ, no BR, também fazia uma prece pelos

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    1. Boa noite, querida!
      Só hoje vi que o comentário veio incompleto.
      Desculpe -me.
      Dizia que sempre faço uma prece pelos ex combatentes.
      Tenha dias abençoados de paz!
      Beijinhos com carinho fraternal

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  6. Que texto lindo, Teresa!
    Quem heróis reverencia
    Preiteia a História e cria
    Memória que se acesa
    Ilumina e dá clareza
    Ao feito heróico, exaltando
    Sua glória para quando
    Necessário se fizer
    Provar que não foi qualquer
    Acontecimento pando.

    Parabéns! Disseram que o povo que não reverencia seus heróis e não recorda a sua História, tende a repeti-la. Gostei bastante de teu texto, querida. Abraço fraterno. Laerte.

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  7. Teresa, desejo que estejas bem. Parece que estás a escrever um livro de memórias. É verdade? Gostei muito do estilo.
    Uma boa semana com muita saúde.
    Um beijo.

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  8. Olá, querida Graça! Deve ser pelo tempo que demoro (risos).
    Não, eu escrevo "a talho de foice". Mas meto-me em outras atividades e atraso o livro de poesia que quero publicar. Na verdade é só reunir o que tenho escrito. Também tenho os netos por perto e o tempo não se estica.
    Entretanto também tive Covid, Felizmente muito leve.. Por aqui continua. Poucos serão os que escapam.
    Bem hajas. Saúde e alegria!

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  9. Aicanices! se existe local certo para comemorar o Dia de Porugal ´será ALcanices ( o POETA que me perdõe). mas sou raiano! não tanto como tu, mas sou raiano também,,,

    uma aledria ver-te, vens para ficar?
    Beijos

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  10. Olá Teresa. Este teu texto fez-me reviver alguns momentos já profundamente mergulhados no passado. Também fui combatente... e ao ler o teu texto, a alma me esfria e renasce aquilo que os "especialistas" chamam o síndrome da guerra. esta "coisa" não se explica, sente-se e transforma-se numa grande revolta. Ah! como tu estás bem navegando sobre as águas desse maravilhoso Douro! Em PAZ!...

    Um grande abraço|

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  11. Olá, Manuel, amigo raiano!
    Ainda bem que te encontro!
    Vou passando quando posso.
    Beijos.

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  12. Adorei o texto, que nos transmitiu uma perspetiva tão pessoal, deste conflito, que trouxe consequências aos 4 cantos do mundo... integrado num contexto mais retrospectivo no tempo... e no espaço, dentro do âmbito deste pacífico cenário do nosso cantinho ibérico!
    Não sei quando o cessar fogo possa ser decretado... mas acho tão estranho que nem os próprios agredidos, falem em paz... estando ambos... agressores e agredidos, mais do que preparados, para continuar numa luta épica... por tempos indeterminados... para conseguirem... a sua... glória?!?! Sentimento tão efémero... E acho tão estranho... cada prédio novo ou velho, ter o seu bunker de sobrevivência... como se o estado de guerra, fosse um quotidiano e esperado normal... desde a anterior Segunda Guerra Mundial...
    Há qualquer coisa de muito estranho nisto tudo... Na semana passada houve temperaturas na ordem dos 34 graus em alguns pontos da Ucrânia... muitas cidades vestiram-se da mais pura normalidade, mergulhando e rindo em muitos rios e cursos de água, pelo país... como se nada estivesse ocorrendo, em outras zonas... e ostentando um status que muitos portugueses não o terão... talvez seja assim, o comportamento de corações frios em tempo quente, pensei eu... quando não se fala em paz, nem parece que se precise muito dela para continuar com a vida! No outro dia, mostraram num canal televisivo, por cá, a santa padroeira de uma cidade ucraniana... foi pintada num enorme mural, num prédio recente dessa cidade em questão... tinha uma metralhadora na mão! Terra estranha... pensei eu... onde nem podemos contar com os santos, para defender a paz... e vão entrar na UE? Deus nos proteja... de valores assim... tão estranhos!... Há qualquer coisa de muito distorcido, nisto tudo! E o Papa... nos seus últimos discursos... bem tem tentado acordar a Europa... há muitos outros valores e interesses... a fazer durar este conflito... em modo kamikaze, aqui para os Europeus... sem que se vislumbrem vencedores... numa luta sem fim... e que... para todos os efeitos... também não começou propriamente agora...
    Enfim! Who knows what tomorrow brings?...
    Um beijinho, Teresa! Bom fim de semana!
    Ana

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  13. Uma viagem que por certo ficará na tua memória Teresa.
    A Guerra... a Paz!... É tão ténue a linha que as separa!
    Revi-me integralmente no teu belo texto. Também eu, sou um ex-combatente! Sei exactamente o sentido de cada uma das palavras e tudo quanto elas encerram!
    Passaram tantos anos e tudo continua tão vivo e presente. Talvez um passeio nesse maravilhoso rio Douro me aproximasse um pouco mais da paz que sempre procuramos...

    Um abraço amiga!

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